Olá Joinville (Sobre ser amiga... de homem - 5)

No último post (que chique), comentei sobre quando perdi minha virgindade. Como já disse que escrever nesse blog serve mais para eu economizar com psicólogo do que qualquer outra coisa.... vamos dar uma volta no meu passado.

Umas das coisas que eu pensei sobre amizade entre homens e mulheres, sempre foi o fato de que existe um silêncio tácito sobre o assunto atração entre os amigos.
”Será que ele quer fazer sexo comigo?”
Humm, diz ele que não, mas e se eu disser:
- Vem, que eu te quero. Ó, só que já vou avisando, isso vai acabar com a nossa amizade.
É melhor não forçar tanto a barra...
É, não é fácil ter amigos homens, é foda você pegar seu amigo tentando ver suas calcinhas... foda mesmo.
Mas, certas vezes depois da “foda” com o suposto amigo, você é capaz de ficar amiga dele mesmo, de verdade. São casos raros, principalmente se a “foda” foi quando você tinha treze anos.

Meu melhor amigo até a época do meu casamento foi o Vitor, meu primeiro amigo e o menino que tirou minha virgindade. Depois disso não desgrudávamos mais. Até o casamento com o traste é claro.
Tentamos transar - que palavra estranha de escrever - mais duas vezes, mas o tempo já tinha passado demais e a cumplicidade também, daí aconteceu o imprevisto: ficamos amigos mesmo, quase irmãos, inseparáveis, dos meus treze aos dezoito.
Vitor sabia todos os meus segredos, minhas paixões e meus medos, bem como eu os dele.
Fizemos todas as bobagens possíveis e imagináveis.

Como a cidade era muito interiorana, nós como bons jovens que se prezam queríamos “ficar doidos”, mas para "achar" naquela época tinha que ser no mato mesmo, nada de coisas pesadas, que isso é coisa pra babaca, ficar com os olhos estralados, com o queixo descompassado e com o astral pesado (nossa, tô virando poetiza).
Bem, resumo da ópera, tomamos chá-de-cogu duas vezes, a primeira vez eu conto em outra postagem, na segunda vez Vitão já estava com vinte anos e eu com quase dezoito, íamos ao casamento da Carla, também nossa amiga de adolescência, porém com um pequeno detalhe, Vitor ela louco por ela, louco mesmo, louco de pedra. Mas, infelicidade dele, ela estava se casando com um cara de outra cidade que chegara ali há uns sete ou oito meses. O cara tinha a maior cara de idiota, mas as meninas gostavam dele, vivia com um livro do Paulo Coelho debaixo do braço e falando algumas merdas sobre auto-conhecimento. O fato é que Carlinha ficou louca por ele, gostava de coisas insossas, que ela interpretava por misteriosas.

Na quinta-feira tomamos o chá, o casamento era no sábado, neste dia saímos da casa de outra amiga por volta das cinco da tarde para chegar na igreja as sete da noite, a família dela morava mais para fora da cidade - outro dia falo da Karen, a pessoa mais desligada que já conheci. No caminho Vitor chorava, dizendo que a Carla era a mulher da vida dele, o efeito do chá já havia passado fazia tempo.
No meio da estrada a Karen para acalmar o Vitor falava da vida, dos pássaros, das plantas, do sol, de Deus, que ele era novo ainda, e todas essas coisas que a gente fala para os amigos quando queremos acalmá-los. Só que nesses comentários falou sobre uma planta que estava em um barranco, apontou lá para baixo e disse.
- Conhece aquela planta ali Vitão?
- Não - disse ele entre lágrimas e um biquinho de coitado.
- Chama-se Trombeta, ou Lírio.
- Ah... certo.
- Tudo na natureza é lindo Vitor, essa flor simboliza desde os tempos do Egito antigo o amor sabia? bla, bla, não perca as esperanças... bla, bla, você deve seguir o exemplo da flor... bla, bla, é o simbolo da retidão... bla, bla, é alucinógena.
Silêncio.
No minuto seguinte Vitor estava lá em baixo do barranco. Catando todas as trombetas possíveis.
- Vamos Vitor, vamos nos atrasar.
- Quero ficar louco...
- Deixe de bobagem - disse a Karen - tem que ferver essa merda, não é assim. Vamos de uma vez, vamos perder a entrada da noiva.
- Me deixem.
O pessoal foi, eu fiquei mais um tempo, amigas são assim, não abandonam nunca...
- Pode ir disse ele - quero ficar sozinho.
- Tem certeza?
- Tenho alemoa (ele me chamava assim) pode ir, vou ficar bem, só queria chorar um pouco sozinho.
- Tudo bem então, te amo viu?
- Eu sei. Vá agora.

Dei uma corrida, alcancei o pessoal e fomos para a igreja. Sete e pouco entrou a Carla, estava linda. Reza vai, reza vem, levanta, senta, levanta, senta, canta, escuta o padre, levanta, senta, pai nosso, dali a pouco entra o Vitor batendo a porta. Estava com barro até os cabelos, a roupa tão linda que ele estava era puro barro, carregava um chumaço de trombetas em uma mão, e em outra havia somente uma, só caule, e ele estava mascando... ele estava mascando as flores.
- ESSA PUTA É MINHA!
A mãe da Carla desmaiou. Todos correram para acudi-la. Eu corri para o Vitor. Tirei ele da igreja enquanto a turma arranjava um carro.
- Aquela puta é minha!
- Cale a boca Vitor, vamos ser linchados.
Fiquei dois dias escondia com o Vitor, até os ânimos acalmarem, minha mãe entrava no quarto onde ele estava embaixo das cobertas suando frio, e ele gritava:
-
Aquela puta é minha! Minha.
- O que foi que você tomou Vitor?
- Nada mãe - eu dizia - é a tristeza... coisas do amor... dá isso... alucinações... loucuras... sei lá.

Sei lá mesmo, anos mais tarde soube que Vitor havia se casado e mudado para o Mato Grosso, levou com ele um pedaço da minha adolescência. O único amigo homem que já tive.

Tchau Joinville.

Olá Joinville (sobre ser mulher - 4)


Será que o cara que passa por mim secando meus peitos acha que eu vou achar aquilo bacana?
- Que gata!
Não pode ser! Não acredito nisso, o cara não pode ser tão babaca assim.
Acho que esse é o efeito colateral dos filmes de sacanagem, meu ex-marido adorava assistir essas merdas, ficava na vã ilusão que uma mulher com três caras ao mesmo tempo, metendo em todos os seus buracos possíveis, é o sonho de qualquer uma, inclusive eu. Daí ele perguntava:
- Você não gostaria?
Gostaria meu “amor”, gostaria que a sua mãe não fosse tão machista e te mandasse um dia lavar a louça quando você era pequeno. Quem sabe não abriria essa sua cabecinha de camarão.
Descobri meditando mais tarde que aquilo era na verdade uma tara dele, o ser humano é tão engraçado (ou desgraçado) que gosta de sofrer, tem prazer no auto-flagelo (é assim que se escreve?), daí também o sucesso das músicas que falam de sofrimento e de gente que foi trocada por outras gentes. Então o idiota vai lá, coloca uma música dessas bem alto e pede uma dose de alguma coisa. Parece que sofre, mas está fazendo aquilo que mais gosta: sofrer. Ou seja, numa análise mais profunda não está sofrendo, já que aquilo lhe dá um certo prazer. (não levem a mal, estou meio alta)
Bem, daí tem a influência da televisão também, fazendo que uma parte das mulheres fique pensando que sua bunda é a peça mais importante do corpo.
Daí o cara olha um enorme de um pinto daquele dos caras nojentos desses filmes e vem perguntar do dele. Insegurança que ele mesmo provocou... que mais tarde se transforma em ciúmes.
Antes de conhecer meu ex eu havia aprontado bastante na cidade, era uma filinha de papai e cheia de amigos e amigas muito avançadas para uma cidade do interior.
Durante anos - muitos anos - mesmo eu escolhendo casar com o traste o meu passado era um incômodo para ele, que coisa louca, eu não ter perdido a virgindade com ele era uma catástrofe, mesmo só tendo conhecido o cara cinco anos depois... O que ele queria que eu fizesse? Voltassa no tempo? Vai entender...
Sobre o que aprontei antes de casar conto nas próximas mensagens. Colocava a cidadezinha de pernas para o ar.
Fugi do marido violento e dos comentários das bocas maldosas da cidade, e para minha surpresa caio em uma armadilha: a maior cidade do estado prolifera o racismo e discriminação (palavras de um rapaz que fez comentários)

Mas deixe para lá, sou livre aqui, vou fumar mais um Marlboro e dormir (sozinha graças a Deus) fodam-se os que fazem piadinhas na rua.
Conselho aos homens, se preocupem mais com caráter do que com seus orgãos.
Tchau Joinville.

Olá Joinville (Sobre ser migrante - 3)

Assisti ha alguns dias a peça Migrantes.

Achei uma maravilha, chorei tanto que nem sei, quando acabou parecia que eu tinha prendido o fôlego durante toda uma era.
Quando cheguei em Joinville, pensei na vida nova que teria, um pouco mais trabalhosa que minha vidinha de esposa-de-empresário-de-cidadezinha-do-interior-do-Paraná, mas muito mais livre.

Maravilha, comecei a ler (livros), ver filmes, ir ao cinema e fui pela primeira vez ao teatro.

A sensação é de tirar o fôlego, pensar o quanto aquelas pessoas ensaiaram, o medo que deve dar em errar. Porque ali não tem "corta, vamos gravar novamente". Coisa louca, e pensar que as pessoas trocaram essa maravilha por uma caixa na sala de casa.

Foi depois que vi a peça que comecei a juntar as peças e me dei conta dos cochichos (é assim que se escreve?) na fábrica.
Os idiotas sabem que sou um pouco (um pouco???) surda, mas não sabem que eu sei ler lábios, engraçado, são peões de fábrica igual a mim, e no entanto ficam fazendo piadinhas... Até então eu não havia entendido o que é ser "paranaense" em Joinville. Agora eu sei.

Bem, fodam-se eles também. Bando de babaca, querem mudanças tão grandes que não se dão conta que é preciso começar com a pessoa que está ao lado e com as próprias atitudes. Acabam fazendo igual ao gerente do setor, que faz igual ao diretor, que faz igual ao dono da fábrica... Que faz igual ao seus avós...

Mas não estou me importando, a vida está sendo muito boa. A sensação de liberdade é demais, estar no teatro e ver outro ser humano fazer aquilo foi uma das coisas mais emocionantes da minha vida.

Voltei caminhando até o terminal do centro, fui bem devagar, o tempo de uns quatro Marlboros, é tão bom caminhar pela cidade de noite, uma sensação tão gostosa, acho que é por esta sensação que as pessoas lutam tanto quando falam de liberdade.